sexta-feira, 8 de abril de 2011

Tchau

2. Na beira do mar



As duas tinham saído pra fazer compras, a Mãe e a Rebeca. E na volta a mãe falou:


– Quem sabe a gente vai andando pela praia?


Atravessaram a rua, tiraram o sapato, entraram na areia. E foram andando pela beira do mar.


Rebeca a toda a hora olhava pra trás pra ver o caminho que o pé ia marcando na areia.


E a mãe olhando pro mar e mais nada.


Era de tardinha. Não tinha quase ninguém na praia.


E teve uma hora que a mãe convidou:


– Vamos descansar um pouco?


Sentaram. Rebeca logo brincou de fazer castelo.


E a mãe olhando pro mar. Olhando. Até que no fim ela disse:


– Rebeca, eu vou me separar do pai: não tá dando mais pra gente viver junto.


Rebeca largou o castelo; olhou num susto pra mãe.


– Neste último ano tudo ficou tão ruim entre o pai e eu. Eu sei que ele sempre teve paixão por música, eu já conheci ele assim. Mas desde que o Donatelo nasceu que ele só vive às voltas com aquele violino! É só tocar, estudar, compor, ensaiar, ele me deixou sozinha demais. – Pegou a mão da Rebeca.


Mas a mão da Rebeca escapou.


– Sozinha como? E eu? E o Donatelo? A gente tá sempre junto, não tá? Nós três. E quando o pai não tá com a orquestra ele também tá sempre em casa. Então? Nós quatro. Sozinha por quê?


– É que... eu não sei como é que eu te explico direito, mas... ah, Rebeca, eu ando tão confusa! – Apertou a boca e ficou olhando pro mar.


Rebeca esperando.


Esperando.


De repente a mãe ficou de joelhos, agarrou as duas mãos da Rebeca e foi despejando fala:


– Eu me apaixonei por um outro homem, Rebeca. Eu estou sentindo por ele uma coisa que nunca! Nunca eu tinha sentido antes. Quando eu conheci o teu pai eu fui gostando cada dia mais um pouco dele, me acostumando, ficando amiga, querendo bem. A gente construiu na calma um amor gostoso, e foi feliz uma porção de anos. E mesmo quando eu reclamava que ele gostava mais da música do que de mim, eu era feliz...


– O pai adora você! Você não pode...


–... E mesmo no tempo que o dinheiro era superapertado a gente era feliz...


– Ele gosta de você! Ele gosta demais de você.


–... Mas esse último ano a gente tá sempre discutindo, a gente briga a toda hora.


– Por quê?


– Não sei; quer dizer, eu sei; eu sei mais ou menos, essas coisas a gente nunca sabe direito, mas eu sei que eu fui me sentindo sozinha... Vazia... Vazia de amor. Amor assim... Assim de um homem. É claro que isso não tem nada a ver com o amor que eu sinto por você. E pelo Donatelo então nem se fala.


– Não se fala por quê? Você gosta mais do Donatelo que de mim?


– Não, não, Rebeca! Entende: é porque ele é tão pequeno ainda, e você já está ficando uma mocinha: então é um amor do mesmo tamanho mas um pouco diferente que eu sinto por vocês dois. Mas isso não tem nada a ver com... Ah Rebeca, como é que eu te explico? Como é que eu te explico a paixão que eu senti por esse homem desde a primeira vez que a gente se viu.


– Ai! Não aperta a minha mão assim.


– Se ele me diz, vem te encontrar comigo, mesmo não querendo eu vou; se ele fala que quer me abraçar, mesmo achando que eu não devo eu deixo; tudo que eu faço de dia, cuidar de vocês, da casa, de tudo, eu faço feito dormindo: sempre sonhando com ele; e de noite eu fico acordada, só pensando, pensando nele.


– Aí não...


– Ele diz eu gosto do teu cabelo é solto; eu digo é justo como eu não gosto, e é só ir dizendo isso pr’eu já ir soltando o cabelo; ele diz às 5 horas eu te telefono, eu digo NÃO! Eu não atendo, e já bem antes das 5 eu to junto do telefone esperando; só de chegar perto dele eu fico toda suando, e cada vez que eu fico longe eu só quero ir pra perto, Rebeca! Rebeca! Eu to sem controle de mim mesma, como é que isso foi me acontecer, Rebeca?! Ele me disse que vai voltar pra terra dele e me levar junto com ele, eu disse logo eu não vou! Sabendo tão bem aqui dentro que não querendo, não podendo, não devendo, é só ele me levar que eu vou. – Botou de palma pra cima as duas mãos da Rebeca e enterrou a cara lá dentro.


Ficaram assim.


– Isso que é paixão? – Rebeca acabou perguntando.


A mãe meio que sacudiu o ombro.


Quietas de novo.


– Como é que... Como é que ele se chama? Esse cara.


– Nikos.


– Que nome esquisito.


– Ele é grego.


– Grego? E você entende o que ele fala?


– A gente conversa em francês.


Rebeca ficou olhando pro castelo desmanchado. E depois de um tempo suspirou:


– E ainda mais essa! Com tanto homem no Brasil.


 
 
 
Continua nas próximas postagens!! Aguardem...

Nenhum comentário:

Postar um comentário